domingo, 29 de junho de 2008

noções banais do cotidiano para uma filosofia vagabunda

Ouço o ruído infernal do tempo roendo minhas carnes e músculos. Sigo a esmo, sabendo não existir medidas para o porvir. Esgoto as energias acumuladas no sono pretérito.
Os motores explodem sobre o silêncio, o latido histérico do cachorro se soma ao som das máquinas, o cachorro late da casa do vizinho, cercado de muros esverdeados pelo musgo, no inevitável movimento de partículas diversas arrastando tudo para a frente, para a morte. As formas da morte se revelam entre as várias faces da vida e tudo segue para inexorável fim.
Ouço seus passos caminhando sobre desvios, suas mãos tateando escuros impertinentes, seus olhos piscando agonias como grilos saltitantes. O lamento de eras ecoa em meus ouvidos atentos. Ouço seu tremor, seu coração rasgando o tempo, sua insistente resistência.
Nada posso fazer sob o peso que se acumula sobre os olhos tristes do retrato que repousa na parede. O amarelo vai se derramando na moldura do tempo. Os sonhos perdendo clareza, turvando a beleza, embaçando corpos e vontades. Nada mais que rastros sobre a fina estrada que se estreita, evocando lembranças, abraço eterno da noite que se prolonga.
A chuva cessa seu ritmo contínuo de horas ? num soluço contido, silenciando o coaxar de sapos e gias. Atiro-me na cama, na ressaca reinante sem temor. Nenhuma expectativa, não espero nada, testemunho esses pequenos eventos que me bastam, à revelia do mundo inteiro que gira do avesso. Ela pensa que estou dormindo, ouço seus passos atravessando o quarto com leveza, tal qual um fantasma que se atira no mistério da noite sem fim.

Cuiabá (MT) · 21/6/2006 19:36

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