segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

o ponto zero da questão

chegamos ao zero da questão.
não há questão.

se isso, sem
solução, portanto.

nada a fazer?
tudo a deixar rolar?

tem coisas que é melhor deixar.
outras, eliminar, até zerar.

aí, começa tudo de novo.
de outra maneira.

o sol na cara.
nas mãos, a peneira.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

99 (um desenho)


número 99 antecede o 00
todo fim - dizem
é um recomeço

das cinzas
ao pó
retornaremos

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

tao qual

acho que é hora de
retro
ceder

parem a gula
que avança intrépida

pesados elos
da corrente insana

caem
sobre nossas cabeças

só use
sem abuse

se lambuzar
estraga

domingo, 23 de novembro de 2008

nós em rede

a rede está aberta
escatológica fuga
pontos difusos
confundindo audiências
do macabro ao sex roll
rola como pedras
jogadas ao léu

pornógrafo 1º

seu corpo baby
desliza surfando
nas ondas pixels

o amor está na rede
o canto gemido
de fadas circes

horas em minutos
passageiras

hordas de onam

sob o efeito de lascivo
torpor

meu reino se desfaz em
borra

quarta-feira, 23 de julho de 2008

ponto do olho

amalgamar
fundir
sem fugir das responsa

antenar
captar
sem fugir

ponto de folga
de tanto usar gasta

quem gosta
baba

de tanto prazer
tonto

sábado, 5 de julho de 2008

a queda (noções banais para uma filosofia vagabunda)

meu velho e falecido avô baiano pedro ferreira dizia entre cômicas reações da platéia: velho morre de três Qs - queda quoice e quaganeira.

quaquaquaquaquaquaquaquaquaquaquaquaquaquaquaquaquaqua

esqueceu do riso.

nada a ver com rizomas. ou outras expressões filosóficas pós-modernas.
tudo a ver com os famigerados ditos populares: morrer de rir, é uma dessas expressões.

(compus uma música assim: já não sei mais o que faço, diante desse seu sorriso fácil/falso, da sua boca roxa sai um oh! de puro espanto, enquanto eu canto, enquanto eu canto, e você ri, ri até morrer...)

falo agora da queda. quair de baiano. quair até morrer.
vi a queda de kublai khan vi napoleão de quatro
vi reis e rainhas coitados
atravessados até a garganta com o gosto do fracasso extremo

todos fracassam diante da constatação definitiva
de que nada permanece

devorei a cabeça de meu pai na mesa de jantar
oferto-me a minhas mais de mil filhas num jantar qualquer na mesa principal

hedonismo clânico
ponderando abalos cataclísmicos

vi triunfos orientais sob cânticos otomanos
vi dedalus breus luzes difusas

você, meu caro fantasma contemporâneo,
vejo sua imagem pura fantasmagoria cibernética
ser de pixels - átomos da imagem

vejo nada
vejo a roda parada
a corrosão do ferro
a morte do aço

que compõem nossos dentes

terça-feira, 1 de julho de 2008

flor de lázaro

lázaro em flor
passeia na garoa

manhã fina
como peles
(pétalas) ao léu

cara leonina assusta
da
desce a ladeira
desce

com
uma prece
qualquer exalando
da boca lazarenta

com uma flor na boca
esquece o cachimbo
adormece na sombra
da vida

esquece
o nome a idade
a cidade

só lázaro passa
na rua vazia
leprosária

a cidade se
esquece
ador
mece

ante
o que se
alastra
bem dentro
aquilo que
bem fora

lá onde dor
me lá
zaro

Cuiabá (MT) · 23/6/2008 13:20

buquê de aromas

teço flores
nesse vaso
delírios

teço enlaces
pedaços colados
de nós

tange a manhã
range (leve)
num bramido

Cuiabá (MT) · 14/6/2008 14:52

sem saída

ruínas. casarões, ruas, caminhos.
ruem. corações, sonhos, ninhos.

sendo assim, só resta continuar.
velas ao mar, navegar, navegar.

guri perdido, envolto em quimera.
alçar ao sonho, ah! quem dera.

Cuiabá (MT) · 12/6/2008 16:32

2 + 2

dois mais dois
pode dar cinco ou três

ou quatro
ou muito próximo disso

a exatidão
não cabe aqui

mate a mate
mática

e terá o caos
aproximado

bárbaras invasões
toscamente calculadas

naus sem
rumo

a bússola
é como dois mais dois

dizque é praquele lado
praquele rumo

como o prumo
que balança

pouquinho pra cá
pouquinho pra lá

mas arruma um jeito
de fincar o pé

Cuiabá (MT) · 5/6/2008 18:06

diálogo insosso

-acho que fiz um hai-kai perfeito, ouça: passo a passo/ o passageiro passa/ cada qual no seu compasso.

-não existe nada perfeito...

-você tá de mau-humor hoje?

-sempre acordo assim...

-você é muito reticente.

- ...

Cuiabá (MT) · 28/5/2008 09:15

pé a pé

para onde vais com tanta pressa? a alma pede um pouco de calma, diz a canção, algo assim. gente precisa aprender que gente dá um passo de cada vez. turbinaram nossos passos. os cronômetros. virou essa corrida: olímpica aventura onde últimos jamais serão primeiros. balela. últimos, do jeito que a coisa anda, nem andarão mais. nada de passo. assim a humanidade vai passando. sem passeio nem água fresca. sombra, só dossol do meiodia escondida de si mesmo tal o calor dessa hora. mais ainda em cuiabá.

uns, passos banda larga. outros, tartaruga no asfalto quente. chiclete de gente. entre um pé e outro. sou rio corrente sou mar sou sol montanha gente sou nada apenas o que nunca pude ser sonho de gente gente que sonha uma meleca pregada no sofá da sala do acaso.

saio cortando coisas com os olhos. igual câmera detalha coisas enquadrando recortando jogando fora tudo que não quer ver. são muitas realidades. muitos recortes. sorrisos nas muitas fotos. pedaços de sorrisos. olhos fechados. fechaduras entreabertas. muitas fontes e miragens. muitos desertos. almas vagando por aí sem encontrar caminhos de vôo. a areia quente grudando na sola dos pés.

Cuiabá (MT) · 29/4/2008 12:37

fogo no rabo do dia

eu prefiro são jorge!
ave. cavalo louco. dragão. você gosta é do dragão.
fogo nas ventas. fogo nas fuças. você gosta é do timão.
porco. bacalhau. urubu naão! flamengo não.
flamejante dragão.
bandeiras em punho.
sou brasileiro. gosto de arroz e feijão. uma misturinha.
pipoca quentão. dragão de novo. fogo.fogo. terremoto não. maracanã em dia de clássico. odeio os clássicos. sos machadão drumondão mundão de deus. abram as porteiras. legião de dragões. ave maria. são paulo. santos de deus. irmãos brasis. sos. brasão na camiseta. sol abrasador. dragão.s fogo nas narinas. na marina. navio timão leme nau sem rumo. sal sem sumo. fruto cítrico. ardência nos olhos. laranja. pinga mel. pinga e mel. céu.
a boca cheia de vazio. línguas de fogo. labaredas.
queimando no céu.

Cuiabá (MT) · 27/4/2008 18:31

lado B

os velhos besouros passeiam pela caixa de som de minha filha.
um sono terrível bota peso morfético em minhas pálpebras.
a imagem refletida na tela exala pixels.
meras imagens.
quimeras quinada.
uma guinada nanauseante.
e o teto já aponta para outro lado.
lado?
pra quê lado?

Cuiabá (MT) · 19/4/2008 14:35

notícias do fim do mundo

I
rua. carro. olhartdoor-
out.
no out.

II
publicitário herético
assassina leonardo da vinci
no out
door.

III

cigarro. carro.
corro.
isabella pergunta: pai você tem coragem de acender um cigarro na minha frente?
tosse. carro. corro.

trago uma culpa
e me despeço: tchau.

IV

vício
foradaslei
de cultura

cultura de vícios
statussocial
amigos bobos da corte

saltitam
macaquitos
com a conta aberta
nas veias do banco
do brasil

(bom dia
se for
capa
taz)

tiagoedgard
hakin bey
na veia

curto circuito na cidade
zona atemporalizada por um sú
bito moment
o
o
o

Cuiabá (MT) · 17/4/2008 10:20

hj é segunda

amor é isso. amo não ter domingos nem segundas-feiras. todo dia é dia.
dia de santo. dia de porra nenhuma.
todo dia é dia de encher a cara de álcool de varar madrugadas decantandoo verbo. catando inutilidades pra não morrer de enfado.
morra de vódka maiakóviski. nem sei se está correta a ortografia. mas me contento em ser um anjo torto. não ligo para esses pequenos erros do ponto de vista dos literatos engomadinhos das academias. punks moderninhos dos shopings centers das academias tediosas. universidades. encontros literários. chazinhos de ingleses fakes. falsos modernos. escritores de plástico. letras comportadas tudo dentro das normas. até os quase-rebeldes só não são por que são rebeldes normatizados. calculados. literatura tem que vibrar e provocar orgasmos múltiplos. se não não dá.
meu saco tá cheio e isso não é uma metáfora. meta-me fora disso.
prefiro os cogumelos e a santa paz bovina.

letras encharcadas de merda e odores que fertilizam novas passagens.
o resto é detrito literário que retornou ao pó.

só pra não esquecer: hj é segunda-feira.

Cuiabá (MT) · 15/4/2008 01:17

rolé na night

meu velho carro segue firme na madrugada.
uma estranha solidão é passageira desse carro.
penso na paz e ouço uma revoada - bater de asas - de espíritos ensandecidos. a madrugada escorre como sangue nas veias noturnas.
onde estão os amigos? cadê os companheiros?
outras vozes rumorejam. tirânicas. absolutas. domínios cânticos expandindo novas ordens em nome do progresso. avante! para trás!
a cantilena dos novos soldados da razão iluminada. soy contra, pois hay poder. mãos de ferro moldando novos bonecos.
páro diante de um boteco. meia dúzia de cerveja para esfriar os ânimos.a noite varre meus pensamentos. nada com nada.
penso que penso. penso que ouço. a passageira pede licença e desce do carro. agora estou só. definitivamente só.

Cuiabá (MT) · 7/4/2008 00:28

confessionall

confess confession
all poems
i am god
allvo de achaquestiques e tals

estram
bólico

bólido
perd(o)ido
no céu
na terra
in ferno

Cuiabá (MT) · 31/3/2008 11:33

passos que passam

ouço seus passos vindos do corredor. o céu lá fora está tão turvo.
mesmo assim não me curvo. não te darei ouvidos. já disse que quero o silêncio. o mais absoluto dos silênciosssssssssssssssssssssssss.

o pássaro pousa na haste do anel.
brilhante pássaro cravejado.

minha respiração tensiona pensamentos que fogem.
a vida passa a cada passo.
o corredor abriga mistérios. mistérios das passagens.

pontes sombrias para lugares que não vejo.




já disse que quero o silêncio.

Cuiabá (MT) · 22/3/2008 18:39

boca de (po)ema

as palavras saíam com incrível facilidade de sua boca.
voavam como pássaros recém-libertados.
riscavam o céu fora da boca.
azul. branco. azul. branco de nuvens. azul.
pura poesia. poeira azulada cósmica desvendando enigmas.
mas a boca estacou de repente. muda. muda.
ninguém entendeu nada.
mas se fez. o silêncio se fez. e uma vez feito. não tinha jeito.
a chuva caindo. um frio cortando a paisagem. agora chovia a cântaros. sobre o pesado silêncio.
chovia sem parar. a boca muda. agora o silêncio saía com incrível facilidade de sua boca. voava na gaiola.
riscava o céu da boca.
os olhos pregados no céu. azulazul.

Cuiabá (MT) · 3/3/2008 17:24

ao meu amigo luisinho

a bola rolava fácil. seus pés eram como as mãos.
a colocava onde quisesse. cabeça erguida. visão total do jogo.
lançava, corria, driblava, sorria timidamente.
golaço: de falta.
lá onde a coruja dorme.

seus pés de mãos agora são asas.
lança voa corre dribla sorri.
agora sem timidez.
só a mais leve paz.

dizem que cantou antes do fim do jogo.
sorriu também.

Cuiabá (MT) · 15/2/2008 17:49

poética besta

eu nado
eu nada

até morrer
na (p)raia

Cuiabá (MT) · 8/2/2008 13:21

pé na jaca

desfio-me
despedaço-me
despeço-me

desfaçatez-me

mal chegou
já quer ir embora?

isso que dá
a mão
já quer
jaca
(n)os pés

Cuiabá (MT) · 4/2/2008 17:23

vulvavulcânica

ela abusa de mim. é verdade. sou seu escravo. mas sempre repito pra ela: você gosta de mim por que sou safado. não uso camisa social. não tenho dinheiro no banco. sou boêmio, não presto, sei disso, sua mãe sempre reclama.

meus dedos percorrem a viola caipira do mesmo jeito que correm sobre seu corpo. faço música com meus dedos e seu corpo se estica todo. parece uma enguia.

fico esparramado aqui nessa nossa cama grande e espaçosa. coço o saco. aliso o pau e você me chama de macaco prego. prego meus olhos na direção de sua vulva vulcânica e você sorri toda sem graça. se desmancha toda.

quando fodemos, os pássaros se agitam no pé de acerola, cantam, voam, se atiram loucamente para o outro lado do muro. nossa foda é um incêndio que queima a manhã.

bebo, babo, fumo, cheiro, dou meu sangue, minha carne, sou seu escravo, já disse, madame libidinosa. mas a alma não dou. nem vendo. tire essa venda, não sou fausto, nem goethe. muito menos dante alighieri.

Cuiabá (MT) · 2/2/2008 00:41

chinadown

dias sem cor. embaçado esse dia. chove ou não? caralho! pedaços de monotonia desfilam pela janela. quase morto aqui: sorriso sem sal sem mel sem porra nenhuma nem sorriso. dias e dias, dizem que é assim mesmo, aquela velha máxima de botequim, nada como um dia após o outro, coisas de sambista bambambam. molho de pimenta? não! pastel sem recheio. vida aérea. etérea como a lembrança vaga da última foda que demos endemoniados no muro da casa do vizinho. lembra? antes tinha mais gosto. ainda gosto, mas falta paixão nessa folia. o carnaval está chegando e não vi a rainha. nem momo. nem madre teresa de calcutá. escuta: que que tem a ver uma coisa com a outra? nada. nadinha. só imaginei madrinha teresa pulando a janela do alto da torre. sem mistérios, é que gosto de ser assim, sem senso, sem bom senso, sem mal senso, sem censura, sem ternura, sem torneira pra fechar, sem conta gotas, sem tortura chinesa, torta de limão é a preferida dela, de apertar os olhos, finge que é chinesa nessas horas, mas não me torture, não tire de mim esse gosto azedo que sinto na ponta da língua ao tomar o primeiro gole dessa cachaça com limão, olhos de china, a propósito, com quantos chineses se faz uma muralha?

Cuiabá (MT) · 30/1/2008 12:27

sem senso nem sensor ou crônicas do mau humor

olhos de mel. escondem o amargo que sai fel da sua boca.
não sou james joyce nem conheço londres ou paris.
viajo nos recortes das mais de mil viagens nas revistas com mais de mil viagens que vendem aos meus olhos desvendados.
choques eletrovolts de revolta sacodem minha carcaça diante dos seus olhos de mel. o fel escorre do céu da sua boca da ponta da língua de navalha que sai picotando todas as minhas viagens de papel.

caralho! o fim do mundo está próximo e nem fui à venezuela. não conheço a martinica. muito menos o canadá.

urubus sobrevoam.
ubus phísicas e patafhísicas. palhaços jarrys de ocasião. de índices. dos recortes dos jornais cadernos Bs dois o caralho que seja.
não me venha com esses olhos de mel!

sai fel
sai fela da puta. filho sem pai. filho de mula. abestado.

um zangão pica bem no meio.
falei pra você não voltar aqui com seus olhos de mel..

Cuiabá (MT) · 22/1/2008 16:01

o fim é aqui

o silêncio corta o sonho na manhã.
a faca a maçã.
fere com ferro a revolta.
muda a estação e o hábito.

habitante de mim

solução?

enigmas se desfazem como pós.
a viagem prossegue num sempre finito.
o fim mora dentro de nós.

Cuiabá (MT) · 10/1/2008 18:49

navenova

todo ano é essa frescura de ficar se cumprimentando: feliz ano novo! acho um tremendo saco, um porre mesmo. não tolero nem ver a telinha da tv com essa avalanche de propagandas com mensagens hipócritas de um otimismo mentiroso. como se tudo fosse ser resolvido dessa vez. os mais otimistas dizem: agora vai! como se o dia seguinte fosse ser totalmente diferente. e é. mas é um diferente em que todo dia é diferente por si mesmo. nada de ano novo. existem as estações e pronto: o resto é balela pra vender peixe podre. o resto é a porra da mídia descarada empurrando com a barriga todos os desejos que se renovam em cada cartão de crédito de um papai noel endividado e cada vez mais magro. haja saco!

acho que vou pegar um vôo diferente. primeira providência: rasgar o calendário. agora há pouco ouvi alguém resmungar que não ganhou nem um calendário novo: de 2008. ótimo, pensei. bom sinal. os ventos me convenceram. vou voar pra lá.

Cuiabá (MT) · 3/1/2008 18:45

desvéu

as ruas passam aos meus olhos
como um caleidoscópio

ópios sapiens sensatos alucinógenos salientando vertiginosas correntes elos de nós gentes que jantam celebram céleres na manhã de falso ócio salve salve

o carro corta fluxos e refluxos
paredes refletidas se perdem no retrovisor

santos homídios cometem homicídios suicídios fraticídios tudicídios tudo idios idiossincráticos uma maçã na cabeça a insensata língua enroscando desanuvios tudo claro cristalino como a manhã que forja a lucidez

são meros caminhos ou descaminhos da via linguagem
livre não livresca com livro ou sem livro na cabeça

como taça invertida flerto com a desembocadura do ser
canduras
de menino que vai e vem nessa gangorra crônica libertina da língua do tato do suor do sabor da labuta livro pode ser sem livro pode ser sem ser pode não ser quem sabe?

modos modelos operandi
não modus não operandi
opero lascivas preguiças

desopero e me estico
largado ao sol
feito lagarto ao léu

véu
quem sou eu?
véu

Cuiabá (MT) · 2/12/2007 12:07

feiúra espantosa

acho que já disse isso antes, mas tem dia que o melhor mesmo seria não acordar.
vítima do meu próprio silêncio. e de línguas que de tão alheias à sua vida até então se tornam ainda mais pérfidas. mas tem língua próxima também correndo solta nos desígnios da maldição. nem por isso menos ferina.
as táticas se diferenciam mas observem bem as pessoas que gravitam ao redor dos mesmos ambientes por onde você é obrigado a passar e compartilhar todas as formas de energias que emanam delas.
vampiros a gente enxerga de longe. o tom doce e cálido de sua falta de sangue - energia vital para suprir suas carências.
alguns se enervam por não não conseguir combater o outro que não lhe dá a menor bola.
a irritação joga contra nossos objetivos.
tem que aprender a dor devagar. só o tempo só o tempo lhe mostrará, diria nélson rodrigues.
a juventude é um defeito que o tempo logo corrige, será possível que hoje só voz cavernosa?
é, acho que vou me esconder o máximo nessa caverna.
que luz demais cega.
luz de menos faz a verdade parecer feia na parede do seu quarto de vampiro. cheia de borrões e escuros.
mesmo por que ela não existe, e se a verdade existir será tão feia mas tão feia que ninguém vai querer encarar.

Cuiabá (MT) · 21/10/2007 20:01

movediço

as cinzas renascem magicamente
como a manhã

triste tristão
isolda partiu com a manhã

o sol chacina
o olhar

entre a magnitude
do dia
da noite
descompass
o
passoapasso

reconstitui
a prece

rege

poética insu
rrecta.

Cuiabá (MT) · 5/10/2007 17:03

astral infernal

deixo-me abduzir. deixo a noite me arrastar junto aos destroços. ela diz quase sussurrando que é tudo consequência da proximidade de meu aniversário. desconverso desconexo balbucio que isso é bobagem. os astros não estão nem aí. penso silenciosamente às escondidas que tinha acabado de descobrir num lampejo fotográfico que tudo está intrinsecamente interligado que nada se separa do todo que a (con)fusão é total. mas tudo que liga separa tudo que acumula excede e explode gerando novos sistemas. nada pára. nada pára. nada volta. tudo avança.

a noite percorre meus instintos de fera arredia. a caverna está escura. platão morreu ao tropeçar na beira do abismo. estava escuro. ele não viu nada.

Cuiabá (MT) · 22/9/2007 18:44

pé de dia

poesia pé de dia reluz
caminhos e descaminhos
pede noite afável
às vezes áspera não espera
chuta a porta
e voa

Cuiabá (MT) · 22/8/2007 12:54

poema absurdo de um dia que dia

dias que sucumbem. como cartas de um baralho viciado.
dias que ruem. como dentes de ratos que roem.
dias que absurdo. como gente sem dente.
dizia que ria. como a boca do lobo diante da hiena.

darias tudo para isso. flores bombons poemas.

Cuiabá (MT) · 24/7/2007 10:32


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Destroços

os destroços da noite são evidentes na sala semi-escura. almofadas molhadas com o suor dos nossos corpos estão espalhadas sobre o piso de madeira.
os últimos motores da noite silenciam-se. vultos, os últimos, se recolhem para suas alcovas.
meus olhos piscam alucinadamente, parecem querer saltar para fora. olhos desordenados. desorbitais.

penso na eletricidade que vai se apagando, restos de faíscas.
penso na guerra, na estupidez humana e nada me consola. meu coração está raivoso.

as luzes se apagam, é o fim do maldito espetáculo, o apogeu da queda, a falência múltipla dos órgãos de um sistema que rui.
rói com dentes de ratos restos da paciência que ainda carrego.

meu saco está no limite.
sob pressão esmagadora. mãos gigantescas parecem amassar minhas bolas.
é o fim, penso comigo, sob dor aguda e lancinante. sob o foco do último farol de carro que ainda consigo ver. a luz projetada na parede.
foi o último que vi.

Cuiabá (MT) · 22/6/2007 20:45

reverberações em si (bemol)

é inverno.
ecos reverberam microeternidades

o salto acontece.
olhos livres passeiam pelo céu sereno de luzes sob a grande árvore.

a queda.
folhas se desprendem dos galhos que secam até o fim do inverno.

depois outono. primavera.
e de novo o verão.

Cuiabá (MT) · 22/6/2007 10:08

intempérie

antonio sodré repetidas vezes estará aqui entre nós banqueteando a farta mesa da virtude e da poesia. entre um cinismo e outro. sem cerimônias. um arroto. um momento de êxtase. poema extraído do livro "Empório Literário - versos diversos" poemas secos e molhados perfumarias e outras futilidades literárias.

intempérie
I
os dias vão passando
uns quentes, outros frios.
a vida é que passa comigo:
eu, ser dos estios.

II
de agora em diante
proponho só me chover
só pra poder ser feliz
e lagos, mares, ter.

III
o oceano do meu ser
desaguou n'outro oceano
e hoje em desvario
eu declino plano a plano.

IV
rompem serras, rompem mares
mares dos pesares meus
mar de mim mesmo
ando a esmo
mar de dores: eu!

Cuiabá (MT) · 29/5/2007 16:06

sonhostantostontossonhos

antonio sodré - poeta dos bons - matogrossense de boa cepa - poeta pela vida inteira - o cara é sópoesia - de andar lento e olho rápido - besta é quem acha que ele é abobado - rebato e afirmo: ele é abobodado - está lá nas abóbodas da vida - não! ele não é encastelado - vive solto por aí - ruminando poemas como quem defeca ou voa com os anjos - você escolhe a imagem.

poema postado aqui visando (olha a visagem!) o programa de rádio overmundo #13 - na voz dele - ouça lá.

vamos ao que interessa:

os sonhos sonhei-os todos
num sonhar desesperado
até me perder sonhando
imerso no meu passado

recordações ilusórias
quimeras imagens tolas
gravadas no inconsciente
pra no presente repô-las!

suscitou-me pesadelos
assanhando meus cabelos
oh! era melhor não vê-los
soaram em vão meus apelos!

mas tem sonhos tão gostosos
dá vontade de comê-los
suaves vôos de aves
caravanas de camelos
transportando em seus alforges
doces, balas, caramelos!

fltuando...flutuando...flutuando

feito espuma colorida
que chego a pensar que a vida
é um sonho em movimento.


(antônio sodré - el pueta de lá transmutación)

+poema extraído do livro de poemas "Empório Literário - versos diversos". (editora Carlini & Caniato - Cuiabá,2005)

Cuiabá (MT) · 28/5/2007 17:08

mortifício

mudo como pedra. não quero falar nada agora. só quero o repouso do silêncio. nem assim consigo a paz que meu espírito tanto clama. infindável batalha entre nascer e morrer. mas se é infindável como pode acabar? sei lá. parece que não tem fim essa tarefa de sísifo. já disse uma vez: sísifo aqui sifú! morrer agora não me apetece. não acho a morte convidativa. ao menos agora. claro que em algum momento ela me pareceu extremamente apetitosa. magra porém apetitosa. magra model. a morte e suas curvas ósseas. modelo desfilando pelas passarelas da vida vendendo desilusões socorrendo desesperados acenando para endividados maridos traídos mulheres abandonadas crianças sem pai nem mãe atormentando a paz dos burgueses prometendo a leveza suprema corroendo nossa pele ressecando nossos olhos que já não querem mais chorar enfraquecendo os ossos provocando outonos fora de época folhas secas pedras que viram pó. tudo no mais profundo silêncio ante os gritos desesperados dos que ficam. mudo de lado agora. vou para o lado B dessa história. vire a página. é só mais uma tormenta que passa. como tudo na vida a morte também é passageira desse trem.

Cuiabá (MT) · 16/5/2007 18:09

mutanteinstanteinsistente

tenho menos de quinze minutos para te dizer adeus.
você percebe a urgência?
perdi as contas das vezes em que tento me convencer de que as palavras são como flechas noturnas às cegas atiradas no negror estupendo de uma qualquer madrugada bêbada e lasciva flecha incandescente buscando as entranhas da soturna noite seus cabelos de pura seda brilhantes pérolas negras escorrendo pelo ralo fétido sua bocarra insana apavorando todos os transeuntes que arriscam passar por ali diante da boca do lobo voraz boca que se arreganha com suas presas finas como lâminas de aço laminando o tempo o tic tac incontáveis vezes marcando no marcador pontiagudo lanças de cronos borrando tudo nesse banheiro de rodoviária môscas mosqueando passando rente aos ouvidos moucos do bêbado que dormita com as calças arriadas até os joelhos seus olhos piscando sonolentos arrastados bêbados sentado no trono dos reinos dos notívagos nas borras da madrugada insensato sentado caído de pálpebras pesadas a diarréia espalhando sujeira pela superfície branca e manchada do vaso sanitário os ônibus partindo sob roncos graves de motores que partem para lugares distantes o bêbado ronca com seus motores (des)ligados levando-o para longe para nunca se sabe onde? onde o mundo dos sonhos? onde pesadelos? palavras vâs e trôpegas flechas soníferas sentidos sem alvos não há alvos nem flecha palavras apenas que a duras penas imitam flechas de fogo que buscam incendiar o tempo pausando tudo como esses minutos suspensos entre eu e você.

Cuiabá (MT) · 30/4/2007 13:13

sou o que jamais serei

tem dias que não devíamos levantar da cama. já ouvi isso muitas vezes ao longo de minha vida. aí pensei, se gosto de sentir o gosto da queda, como não levantar? levanto e caio e levanto novamente. é o ritmo que me seduz. tipo esporte radical. saltar diante do abismoso insondável. saltar diante dos rugidos das feras mais bestiais. saltar diante do dragão desafiando suas garras e o fogo lançado de suas narinas. mergulhar nas profundezas de mares abissais nunca dantes navegados. profundidades improváveis. sonhos malucos revoltas fumaça calor poeira calor rush chuva lotação maldição dados mallarmé rimbaud um lance a mais um lance de dedos dédalus dá a luz trista tzara tristes trópícos calor ressaca dadá gugu jogos infantis lúdicos jogos mortais lúdico jogos lanceiros infernais paradisíacos jogos divinos profanos jogos lance-me se for capaz ah meu caro rapaz olho no olho dente por dente leão banguela pinguela pontes do acaso árvores caídas calor infernal lotação rush global. sem saída? palavras ao vento. cibernético. o futuro é virtual. jogos de memória.

Cuiabá (MT) · 23/4/2007 18:08

não senso não

a primeirapalavra agente nun ca
esquec
e
a curva
o S
das suas cur
vas
o SSSS
sibilaríssimo
de sua língua
que en
rosca
oca
minha

caver
na
SSSSSSSSSSS

sol e lua
en roscam
-se
no meio da sala

SSSSS
psiu

Cuiabá (MT) · 13/4/2007 12:37

fluxus interruptus

a pele petalada sensível espinhenta
rugas demarcando caminhos do tempo

viver será a sua maior sentença

caralho
volte e solte
o fluxo contínuo
o verbo preso que enche de horror
sua garganta
sanguinária
preces louvores
nos corredores surreais violáceos

sem sentido
sem sentido

repetidas fugas pelos descaminhos do caos
a eterna preguiça

banido de todos os gêneros
ah! fora do tempo
como uma partitura
sem nós sem fios sem saída
a música universal
em desarranjos letrados

desfocado
diluído

arredia figura
oculta
feito tatu

tateando
tatuteando

na superfície cava

Cuiabá (MT) · 23/3/2007 18:38

o infinito é aqui?

a chuva cai desabando sobre nossas cabeças. um sol absurdo insiste em permanecer na urbana paisagem. seus raios atravessam as nuvens como flechas de luz. caminhamos decididos na direção do infinito. alguém disse que é para aquele lado. as flechas cegam momentaneamente. as pálpebras pesam sob a violência da água que despenca do céu. corpos encharcados como penas de anjos. assim mesmo conseguimos levantar vôo. acima das luzes. das nuvens. agora ficou tudo muito leve. no corredor de luzes e átomos. o infinito é tão longe.

Cuiabá (MT) · 23/3/2007 17:19

a sombra do vagalume

vejo luzes. cruzes.

é assombração?

fecha os olhos menino.
é espiação!

espia
espia

o vagalumeluzia

assombra
o vôo assombra

luzalumia

vagante lume
sob a sombra

voa sol poente

Cuiabá (MT) · 10/3/2007 23:55

fechado para almoço

domingo insosso. gosto de nada na boca.
nem banana adoça.
ou maçã.
manhã massante.
amassa-me, ou devoro-te. sou devoto de nada.
nadando em indiferenças.
que diferença faz?
faça-me o favor: a guerra não pára. o filho-da-mãe do faustão azucrinando a porra da minha cabeça. fecho os olhos e sua voz gruda sobre os silêncios da tarde (já é de tarde). zapeio canais tentando fugir do massacre.
dirás: não amarás rimbaud: não matarás kafka: não trairás drumond, nem se chamará raimundo.
gosto de nada na boca sem saliva impregnada de não-quereres.
bem-me-quer-mal-me-quer-bem-me-quer-mal-me-quer-bem ou mal
qualquer coisa para engrandecer esse domingo sem futebol sem carnaval sem ressaca sem a marca do pênalti sem bola nem saco pra chutar.
um brinde aos medíocres.
a vala dos comuns.
fecho a tumba.
o cemitério está fechado.
os mortos ao almoço.

Cuiabá (MT) · 4/3/2007 14:07

tripas ao léu

vou tentar. uma letra duas tretas e o ringue se ilumina.
sinos.
assassinos. quebraram o braço da coitadinha.
coroas de flores.
risos.
sorrisos do morto. intermitentes. já flagrei duas vezes.
acho que ele ri da minha ignorância.
ânsia.
anciãos malditos abarrotando as prateleiras de merda. insanos.
droga. o ônibus quase me partiu ao meio.
parto.
tão perto o bebê nascido é jogado fora na lixeira do vizinho.
vou tentar de novo.
ovo.
é assim que começa.

Cuiabá (MT) · 17/2/2007 18:40

entre-ser e nada

poema mínimo de fábio guimarães, poeta matogrossense. sem mais delongas: da série: saco de gatos & outras


e a rosa
entre o ser
e o nada

amanheceu
serenada

(fábio guimarães)

Cuiabá (MT) · 10/2/2007 16:32

SOS Terra

o futuro acaba ali!

essa foi a última placa
que ele viu
antes

Cuiabá (MT) · 4/2/2007 16:21

sos hj

o que significa isso? hj?
pode ter sido ontem. mero engano. acho que a secretária esqueceu que era hoje o aniversário de minha mãe. será que as flores e os bombons chegaram logo cedo? nenhuma expectativa me condena à fôrca. nenhuma gaiola me depositará na posição acéfala prisioneira sem nenhuma conexão com nada. sou demasiado solto para fazer parte de qualquer núcleo. sou demasiado morto para isso.

comecei o dia atropelando um gato preto que pousou sob a sombra da sete copas. não vi. ele tava morgado. o pneu de borracha velha de sol e chuva passou bem rente à cabeça. passou sobre o pescoço que respirava na lentidão das horas relaxantes de quem dorme profundamente. esguichou muito o sangue bem vermelhão logo de manhã. vomitei. ah! não aguentei não. vomitei.

agora estou melhor. preciso chegar logo ao escritório. o espelho do quartinho do fundo da casa estava quebrado quando olhei minhas olheiras refletidas roxas fundas nas covas rasas de minha existência de face fantasmagórica.

o escritório parece que está igual um velório. que caras são essas?
a dona marli que é tão alvissareira. oi dona marli. de olhos baixos? por quê será? minha sala está tão quieta. mamãe deve ter recebido
as flores. os bombons também. o interfone toca sem parar.
alô. dona marli?

notícias novas são sempre surpreendentes mas a gente se acostuma. as coisas são efêmeras mesmo. acho que vou vomitar de novo. mamãe morreu. o chão do escritório está tão limpo.

Cuiabá (MT) · 10/1/2007 10:42

manhã de sol

aquela rosa nasceu numa manhã de sol. rubra vestida de pétalas tão brilhantes. nasceu sob orvalho diamante luz. gotas que reluzem. ninguém notou que os olhos dela choravam. tamanha era a tristeza. rubrolhar. eras de saudosossonhos.

alguém colheu a flor e guardou-a no peito. coração palpitou. impassível tempo que consome.

aquela flor lançou uma chama em seu corpo. sangue rubro aqueceu a carne já fria sob flácida pele.

vibrações novas espalharam antigas sensações. reacesas.
novas cores. nova estação em seu peito.

aquela flor nasceu numa manhã de sol.

Cuiabá (MT) · 3/1/2007 19:09

saco de gatos

versobar de anna marimon. 28 de dezembro de 2006. últimos minutos do jogo. a mesa rola de boca em boca. baco e poetas. vinho beer lábios. bola 7 na caçapa. desce o (p)ano. velhas cortinas se abrem de novo.

a lua
ri
sólis
na boca
do céu

(anna marimon)


quem só
riu
ruiu por úl
timo
timoneiro

(e.ferrera)


quem sorriu
por último
riu só

(amauri wolf)


eu não quero as réguas
para traçar os meus caminhos
eu prefiro as éguas
num galopar torto e veloz

(antonio sodré)


rosalvo era calvo
mas nem por isso
tinha uma cabeça brilhante

(antonio carlos)

by caximir - saco de gatos - (re)vidas.

Cuiabá (MT) · 29/12/2006 14:39

hai kai

do fundo do quintal
ruidoso sol
na garganta do pássaro

Cuiabá (MT) · 30/10/2006 17:13

Dennis-Boy

Sua mão direita trêmula gira febrilmente a maçaneta desgastada e cheia de pontos de ferrugem espalhados pela superfície metálica. Apartamento 210. Hotel Centro-América. Dennis Boy lento entra no quarto mal iluminado e senta-se pesadamente na cama. Seus olhos não param em lugar algum, buscam pontos de apoio. O vazio parece lhe sorrir com a boca escancarada de morte.

Tarde abafada, muito quente mesmo, pensa ele, ao arrancar a camisa bruscamente. Deita-se, aliás, deixa o corpo cair com os olhos pregados no teto branco e cheio de manchas esverdeadas de infiltrações. Seus braços marcados de ponta a ponta pelos muitos picos parecem pulsar, as veias se sacodem com o sangue furioso e febril, lavas raivosas, tudo pulsa. A morte rondando como uma bomba relógio irrequieta.

Sede absurda queima seu interior, corre até o chuveiro e de boca aberta recebe com avidez água morna e enjoativa. Vomita então. A memória esgarçada puxa fios desconectados, tenta recompor cacos, os rostos mais familiares desfilam quadro a quadro aos olhos imaginativos. Pensa nos filhos, estarão bem? Ficarão bem?

Ele revira a sacola que contém apenas uma calça surrada, uma camiseta e muitas seringas. Não acha o que procura, onde estará o pó? Onde guardei? Se pergunta desesperado. As mãos cada vez mais trêmulas vasculham sem parar, uma sensação de pânico o invade. ?Onde deixei a porra da cocaína? Gastei toda a grana que restou do meu salário nesses três dias que ando sozinho?. Seu pensamento se embaralha, uma febre insuportável sobe pelo corpo agitado. ? Sem o pó não vou suportar?. Sua última esperança é a calça velha de guerra, apalpa-a, alívio, o pequeno volume está ali no bolso da frente, 20 gramas da mais pura que conseguiu.

Pegando a seringa com rapidez incrível corre até o banheiro, abre a torneira, enche o pequeno recipiente com uma dose cavalar. O ritual o tranquiliza, as mãos ficam firmes. Tateia o braço esquerdo, as veias estão abertas para mais uma dose, passaporte para o único prazer que resta. Injeta com maestria, deixa o sangue voltar, diverte-se com o vai-vem dos líquidos se encontrando, pororoca sobe pra cabeça em explosão de infinitos pontos de luz, o coração quer saltar do peito arfante. Reconforta-se por instantes expulsando os seres malignos que rondam esse momento de vazio e desespero. A droga preenche os espaços violados pela opressão de todos os seus fantasmas.

Um turbilhão agita seus pensamentos quebrados. Estilhaços refletem pequenas luzes. Razões pulam incertas sobre delírios artificiais não se encaixando nesse jogo de morte. O efeito expira rapidamente, é consumido com avidez e ansiedade crescente. A obsessão toma conta de sua cabeça, preciso de mais uma dose! Quero outra dose! A seringa se sobrepõe soberana sob os aplausos dos fantasmas mais insistentes. Injeta mais uma. Outra. Mais. Mais...

A cadeia se desfaz em estertores. Gotas de sangue rolam de seu braço, uma lâmina fina vermelho ralo atravessa a superfície cheia de crateras mortíferas. As pálpebras cerram. Boa noite. Boa sorte, Dennis-Boy.

Cuiabá (MT) · 19/10/2006 13:21

chuva de fantasmas

I

Escrevo para você. Personagem sem nome.
Sombra que caminha colada a meus instintos básicos. Luz
que incendeia os sentidos e dá sentido aos ritos de amor e poesia.
Seu silêncio invisível penetra pelos poros--------------------------------porões
pele e mente e busca
saídas pelos buracos do meu corpo ? notadamente pela boca ? língua que estala no ar procurando uma palavra que seja o espelho exato para a compreensão refletida nos seus olhos. Palavra que reinvente o verbo ? silêncio; a tarde morna roçando a pele e a mente torpor, a demente sensação de que tudo
o mais
não mais importa
o mundo acabou ali naquele instante em que o grilo prenunciava o começo de tudo ? névoas de poeira vermelha ? pele pálida ? sorriso vampiresco ? dentes sujos de nicotina, cheiro de cebola com bifes crus, dentes sujos de carne, o palito quebrado sobre a mesa, a pizza esfriando, o sorvete de chocolate derretendo aos olhos mudos ? a boca sorri demência ? sorridente ? esperando a mosca pousar no prato do vizinho.

Procuro a palavra maldita busco rebusco para incomodar seus ouvidos puros e imbecis ? sua voz trêmula de medo ? sua incapacidade ? você agora é outro personagem ? você não é você agora ? você é duplamente fadado a atuar por todos os papéis ? o script agora é outro ? busco a palavra soturna, aquela que vai revirar seus intestinos frouxos ? seu medo de peidar ? suas medidas controladas ? sua vontade de quebrar as réguas ? suas receitas médicas ? suas doenças crônicas e indefinidamente crônicas ? sua falta de apetite, sua falta de força para soltar os neurônios nos campos livres dos instintos básicos-
Busco a palavra e eis que me deparo com o velho fantasma de Charles Baudelaire balbuciando versos repetidos ao longo da eternidade fria e repleta de enigmas, o espírito vagando a esmo: são suas as palavras que encontro ao vento na voz do fantasma bêbado -?...meu gato procurando cama no acolchoado/ agita sem cessar seu corpo de leproso; a alma de um velho poeta erra pelo telhado com sua triste voz de fantasma chuvoso...?


II


Te afasta de mim velho fantasma desgarrado! O cemitério está longe dessa morada. Quero sossego e não és bem vindo na madrugada que vem chegando.
Seus olhos sem brilho não apetecem os meus claros enigmas. Sua pele de meia-luz fantasmagórica não trás calor e sinto frio diante de sua evidência.
Quero o calor das virgens, a maciez das bocas divinas - suplicantes de amor.
Quero a pele sedosa da ninfa de pêssego que roça meus pelos.
Céus, quero vida agora! Quero respirar a tranquilidade que a hora sugere.
Mas a fera sacode meu peito, quer arrancar meu coração com suas garras de metal!
Taquicardias intermitentes assaltam minha concentrada postura - debruçado sobre as linhas brancas do vazio do papel.
As palavras dançam no caos procurando sentido para a tarefa do diarista enfastiado.
Tolas e trôpegas são as notícias que vêm do além ? da boca dos mortos que se ausentaram dos cemitérios.
Murmúrios ? cantando a canção dos ventos.
Além muros ? cantando a canção dos ausentes.

Cuiabá (MT) · 7/10/2006 17:02

obesa

Naquela cidadezinha vivíamos a impressão nítida de que jamais cresceríamos, uma morosidade rastejante parecia eternizar aquela fixidez como uma fotografia panorâmica. Os silêncios da hora pós almoço não incomodava alma alguma. O cemitério jazia mornamente enquanto os mortos tiravam merecido cochilo.

Numa daquelas tardes sem fim, a população aguardava com respeitosa impaciência o enterro de um senhor que era tido como um dos principais fundadores da cidade. O enterro aconteceria impreterivelmente às dezessete horas, visto que o defunto já começava a dar mau cheiro. Zé Coveiro estaria lá, afinal era o único coveiro da cidade, seguindo uma tradição de família. Não é todo dia que morre gente importante. Dia de pompa para o Zé que preparou sua melhor roupa para a circunstância.

Guri dos mais terríveis, lobo em pele de cordeiro, cara de anjo, riso inocente, menino exemplar, minha cabeça rodopiava sem parar pensando no plano infalível que surgiu como um raio brilhante: era o momento em que finalmente me aproximaria de Obesa. Era o único da turma que não conseguira essa façanha e estava incomodado.

17 horas era a hora do seu banho diário. Diziam na cidade, onde o cardápio principal era falar da vida das pessoas, que Obesa somente deixaria de se lavar naquela hora, no dia do seu próprio enterro. Nem no enterro do prefeito eu iria às cinco da tarde, dizia ela, debochada, rebolando seu corpo imenso e voluptuoso. Às cinco em ponto a cidade inteira se espremia na porta da igreja de onde sairia o féretro. Menos Obesa, e eu, é claro.

Deu branco na hora. Esqueci todo o plano que havia elaborado por horas a fio e não conseguia dar um passo na direção do abismoso terreno. Cada minuto perdido era um tempo irrecuperável e, ao mesmo tempo, me encurralava. Bezerro prisioneiro do medo, mugindo abafados gemidos de tristeza e solidão.

Cinco horas, e a tarde se fechava em copas, galhos poderosos abraçavam minha figura miúda diante da gigantesca tarefa. Ela saiu da casa trajando apenas uma calcinha vermelha, minúscula diante do exagero de suas formas. Pegou o caminho da bica e deslizou direto para o seu palco imaginário, a água caía refletindo diamantes sob a luz do sol que ameaçava escurecer o mundo de glória de Obesa. Ali era Rainha, atriz principal, estrela da companhia - grande teatro da vida. Ela tirava a calcinha enquanto caminhava, se exibia e ria provocando o gato, os cães que roçavam suas pernas, galinhas, pardais, rolinhas, ela exagerava nos movimentos de seu corpo obsceno.

Aquele era o momento. Saí de trás da moita com cuidado, quase sem respirar, ela estava de costas para mim, um dos cães rosnou em minha direção. Obesa se virou sem pressa, languidamente, com os olhos caídos de paixão e benevolência. ?Oi franguinho, não precisa ter medo, venha até aqui. Não tem ninguém para nos ver...

Fui chegando mais perto, desconfiado e tímido, as mãos tentando esconder minhas indecências que saltavam do calção sob o olhar guloso de Obesa, minha Deusa. Ela riu, debochada, da minha falta de jeito.Agarrou-me com decisão e me arrastou até a bica que jorrava água sem parar. Dali em diante não vi mais nada. Por vezes, achei que morreria afogado sob seu gigantesco corpo e pela água que caía da bica como uma tormenta sobre meu rosto desesperado. Mal lembro o que senti, mas era desconfortável. Ela gargalhava sem parar, loucamente, cavalgando sobre mim. Gemia estranhamente, soltava grunhidos grotescos molhando-me inteiramente de fluidos gosmentos e mornosos.

Nunca mais quis assistir os banhos lascivos de Obesa, mudei de rumo, eram muitos os quintais em nossa cidade.

Cuiabá (MT) · 25/9/2006 20:33

fugaz

pontos de fuga-fuga
zes
fuga
dos domínios normais

domínios de ocasião

jogo brutal comanda nossos instintos
compõe rotas descontínuas
insinua variantes

variações extemporâneas

lances raros
acasos

como árvores que dão
frutos
doces
até o enjôo

Cuiabá (MT) · 19/9/2006 17:16

um lance de acasos

jogos cardíacos
ritmos de emoções
incontidas

um lance muda o rumo
equação imprevista

um lance do acaso
pedra que estilhaça

formação constelacional
nave estelar

fogos divinos

a festa dos céus

Cuiabá (MT) · 15/9/2006 17:53

revoada

a vida se sucede
de lance em lance
como um livro aberto
páginas brancas
revoada de pássaros
buscando pouso e descanso
para suas asas
mergulhões viajantes
tuiuiús andorinhas urubus corvos águias gaviões
o vôo cego do morcego
tele-guiado
mergulhos instintivos
desordeiros

é preciso cair
para (re)voar

Cuiabá (MT) · 13/9/2006 17:59

amor a primeira vista

nosso caso
foi de amor a primeira vista
mas veja, meu bem
como foi dura
nossa conquista

o peixinho do aquário
morreu por suas mãos
escorregou entre os dedos
vôou para outro destino
livre
além longe
daquelas paredes
de vidro
que o separavam

a canção se nutre disso
sonhos, vôos, rabiscos
emoções

ai amor!
por quê nos apegamos tanto
às coisas vivas?
às coisas todas?
até as mais tolas?

um instante apenas
e me desmancho
como nuvem
sob vento louco

as amarras do amor
nosso parto de luz

Cuiabá (MT) · 5/9/2006 11:57

sinfônico banquete

sobre a farta mesa - excesso de cores e texturas diversas desprendendo cheiro imantado ? a Carta de Princípios na cabeceira. dentes em mastigação voraz. olhos gordos e gulosos vigiam pratos alheios ? mal vêem o que comem ? mordidas sem medidas ? bocas elásticas prestes a explodir ? frontes gotejando. peru ? linguiça ? assado de carneiro ? farofa de ovos ? pimenta bode dedo de moça malagueta ? vinhos ? cachaças diversas ? limonada ? feijão ? leitoa assada ? frangos ? cozidos ? montanhas de arroz branco de forno... cristais, castiçais, pratarias tilintando sinfônico banquete.

o padre, o médico, o delegado, o prefeito, o promotor, o juiz, o industrial, o mega empresário. cupulação. confraria. dia D, reunião, Carta de Princípios na cabeceira da grande mesa. só que ninguém, por essa esperava. um simples e fatal engano da coitada da Maria Preta, velha cozinheira, até hoje não suporta a lembrança, tudo caindo, foi puro e simples engano, no lugar do tempero o veneno!

Cuiabá (MT) · 1/9/2006 19:27

sexo de anjo

palavras
circulam
rondando
o centro
nuclear
dos sentimentos
feéricas
bobagens
ôcas
ou
grávidas
prenhes
de poesia
e ironia
coisas
sem nexo
tal qual
os anjos
e seus sexos

Cuiabá (MT) · 21/8/2006 21:07

à sombra de vela

a luz da vela
faz mover os objetos

bruxuleantes sombras

vacilam de um lado
a outro

ao som do vento
artificial
condicionado

aos gritos da vizinha
que goza - gozorgasmogueia -
berrando na nigth
ecoando para sempre

a vela queima
devagar
devagar
devagar

Cuiabá (MT) · 17/8/2006 19:40

domingo, 29 de junho de 2008

cronossintoma

dia a dia
consumimos
a chama

apagamos
origens remotas

aquietamos

vítimas do carbono
e do silêncio

Cuiabá (MT) · 11/8/2006 20:24

navegante

folhas passadas
folhas das relvas de whitman
cadernos de valéry
velhos diários de guerra
carta do anônimo
pero hay caminhos
aviso aos navegantes
preparem os passaportes
pessoas: a única conclusão
é morrer
só resta portanto
viver
a viagem segue
on the road
kerouac
pé na estrada
pé na tabua
a estrada é real
o sonho nunca vai acabar
dicke sorri diante dos
infinitos horizontes
cartografias para bêbados olhares
embebedai-vos
embebedai-vos
de vinho, virtude e poesia
buquê de flores
baudelaireanas
cachos dionisíacos
uvas e bacos
trincheiras
vigilantes do prazer
intrépidos viajantes
nuvens negrores
chuvas fertilizando
terrenos que se abrem
-abram as comportas!
a percepção the doors
deixa entrar
somos filhos dessa viagem
passageiros dessa nave
rumo à vertigem

Cuiabá (MT) · 4/8/2006 10:51

vertigem na manhã

eis um
corpo
que cai

experimentai

com sua
dentição
de verme

mastigue
mastigue

ovos
de creme

Cuiabá (MT) · 3/8/2006 10:32

diário (l)ôco

ôco que nem cabaça
chacoalhando no ritmo interno
dessa máquina louca

motor que move
o desprezo
pela beleza e harmonia

investidores
que assaltam bolsas
bolsas que assaltam nossos bolsos

consomem carnes e músculos triturados
nervos em frangalhos

impõem a maldita condição
o descaso
a impotência
da vontade

espetáculo grotesco
formas sombrias
teatro dos obscuros

contra a luz
recortes enigmáticos

-acorda fantoche!

a corda
pendendo
no ôco das horas

balança
balança

Cuiabá (MT) · 2/8/2006 16:41

jardins infernais

a noite galopa sobre meus ombros. atravesso velhos jardins sob galhos esqueléticos. eles rasgam minha pele alva. a noite é áspera e brutal.

sou sombra, vulto fantasmagórico além alegoria. pressinto a morte que ronda as casas com seus véus soturnos. encobre consciências, isola-as, afasta de vez o meu canto do seu canto. nossas vozes silenciam.

nossos amigos estão morrendo e as esquinas da cidade estão ficando cada vez mais vazias. o cheiro de álcool exala da sua carne, você me abraça com seus olhos de vampiro. seus dentes mordem minha carne com volúpia. a lua sorri matreira. se esconde nos umbrais de um prédio velho e esquecido. você me arrasta como se levasse um cadáver ainda quente. sinto a trituração sob suas garras de aço. quem é você?

a voz não sai mais. deixo-me levar.

a noite é longa e meus olhos se fecham nesse momento para mais um breve pesadelo.

Cuiabá (MT) · 29/7/2006 11:48

hell city

a cidade arde
corações em chamas

alta combustão nos semáforos
roncam os motores

sinal vermelho
para os pedestres

as ruas se consomem
gases fugas solidão

Cuiabá (MT) · 26/7/2006 18:15

compasso de espera

aqui
sentado num sofá qualquer
de uma repartição pública
o vento geme
do ventilador barulhento

tudo gosmento
asco
o asno sentado sente asco
o asno expulsa o almoço ainda quente
tomates cozidos
roídos por enzimas
ácidos revolvendo alimentos
mal mastigados

a pressa inútil
estados febris
desequilíbrios

enfastiado -

o sol se põe devagar
todo dia
na mesma hora
sem pressa

talvez devesse
me espelhar nisso

Cuiabá (MT) · 25/7/2006 16:39

o verbo silêncio

poema de anna marimon. poeta de tranças. loura louca celta. mt mix rs. entendeu? não importa. leia o poema.

O silêncio criou raízes dentro das palavras. A tarde emudeceu,
coloriu de pálido o contorno das árvores. O respirar das folhas era azul. O silêncio torpor
o verbo vinho
o silêncio palavra

A tarde criou raízes dentro do silêncio

o silêncio palavra
o pálido verbo
o vinho torpor

O verbo emudeceu dentro das palavras

a palavra tarde
o verbo silêncio
o pálido vinho

O silêncio torpor, a palavra verbo,
o pálido azul do silêncio morto.

(anna marimon - cuiabá, 2006)

Cuiabá (MT) · 21/7/2006 17:52

solidown

que importa chamar teu nome
se finda a noite
e os escuros estão partidos?

reinvento a manhã
(tecendo fios invisíveis)

reinvento

a chaleira esquecida
fumegante
é um banho
de solidão

sobre o velho fogão

Cuiabá (MT) · 19/7/2006 19:18

assim sendo

aqui é o meu lugar
pois aqui é o lugar que tem tudo que preciso
para mim agora só existe esse lugar

uma varanda ampla, a tv ligada, a prateleira repleta de livros, a tarde morna. nenhum vento para importunar a paz repousante das folhas do pé de acerola
nenhum mistério assombroso

os ruídos são fisicamente naturais
objetos estalam no eterno movimento das partículas
rompem o tempo em suas aparentes imobilidades
tudo está em trabalho
tudo que liga se segura para permanecer

a ferrugem corrói
meus ossos se abandonam na rede
respiro mais profundamente
afundo
na irrelevância dessa hora

me deixe em paz
já disse que não quero nada

o rio da minha vida corre nos subterrâneos dessa cidade
desse quintal.

Cuiabá (MT) · 16/7/2006 21:28

quarto blú

uma linha tênue começa a delinear (per)fios de uma história da vida. uma vida qualquer. dessas banais, comum demais. um cara solitário sentado numa mesa de um quintal de uma casa típica de classe média, tomando cachaça e olhando o tempo passar. como se tivesse de fora. só dentro de si mesmo, girando em torno do próprio umbigo, vazio como um saco de plástico vagabundo de supermercado.

Z surgiu a minha frente de repente, como um som apenas. surgiu como um zunido persistente, zunindo confissões de séculos, ecos perdidos buscando sentidos em sua travessia de eras ? ligando los olvidados.

a garrafa de cachaça repousa sobre a mesa atraindo môscas que vivem de dar voltas e voltas ao seu redor. a garrafa que nada esboça, quieta em seu silêncio de fogo. como pedra esquecida. só o tempo roendo o amargo passageiro.

estou fodido! fico pensando. estou ficando mole, cada vez mais afundando o pau no travesseiro. a cachaça já não desce doce. desce rasgando meus aparelhos que digerem, ainda bem, continuam digerindo bem.

Z tá me pentelhando com sua bosta de história de vida. vivo caçoando de todo mundo e agora estou aqui de baixo astral, a cabeça baixa com os olhos grudados no chão áspero e sujo. a cachaça começa a me deixar zoado. esquenta o peito e me faz notar o quanto estou enjoado de tudo, de todos, com náuseas constantes. tô de saco cheio de trabalhar e continuar duro, sem grana, vivendo de truques, a gente vive de golpes, pequenos golpes, ela diz rindo na maior cara de pau. dá vontade de vomitar só de pensar em fazer filmes, aquelas produções chatas, um monte de gente chata, metida a besta, ah maldito poder que sentem os que lidam com imagens, que mexem com egos inflados e imbecilizados pela própria (auto-)imagem. escrever me alivia um pouco, como uma boa cagada, uma mijada num poste de rua qualquer.

Z me lembra um esgrimista. touché!
Z me lembra um labirinto. touché!
Z de zilda zorro zorra zona. Z da inevitável zebra. bah, a vida que dá zebra e de repente você percebe que zebrou tudo. a maldita condição de fracassar. fracassar. fracassar. estar sempre recomeçando, estar sempre esculhambando tudo, com a boca cheia de môscas rodando pra lá e pra cá num vaivém zonzeante, môscas zonzas atraídas pelo bafo de cachaça. sem um puto nos bolsos e com as apostas prontas para o próximo lance.

há poucos minutos atrás uma ?garota de programa? me abordou no posto de gasolina perto de casa, fui comprar cigarros e enquanto aguardava o atendente, cabisbaixo e ausente, uma voz me tirou daquele estado letárgico. - oi. levanto os olhos e vejo seu sorriso irradiante, de larga boca, de belos dentes, taí um belo espécime, pensei, um arrepio passou pelas minhas bolas escrotais e invadiu todo meu corpo. saí sorrindo meio sem jeito, um babacão, elas deviam estar pensando, eram várias garotas lindas em um carro branco. fiquei todo prosa por que ela veio direto pra cima de mim, ignorando todos os outros rapazes que estavam ali. elas saíram zunindo no carro branco, cintilante, desfilando pela avenida fernando corrêia.

meu saco tá murcho agora, continuo aqui sentado nessa cadeira, desfiando linhas imaginárias, definhando, na cadência do tempo e seus vazios. a tv ligada joga na cara um monte de propaganda estúpida que vai deixando todo mundo estúpido, imbecilizado diante da telinha, todos presos por fios invisíveis, atados ao desejo de tudo consumir, de se auto-consumir em impotências provocadas, como idiotas completos, cegados pelo brilho intenso e sedutor da maldita caixinha azulada. estou out.

nenhum movimento na cozinha da casa, nenhuma meleca sendo preparada, nenhum cheiro. não sou herói de nada. sou página virada de uma história que nunca completou capítulos, que nunca contemplou minha ninharia de vida. porra Z me deixa em paz com seus delírios de analista, pára de ficar me colocando nessa berlinda, nesse centro de nada, fustigando minha falsa paz. fica aí com esse par de olhos me olhando, tentando decifrar meus enigmas. em cada olho vejo uma sentença, eles parecem independentes um do outro, não se completam, ao contrário, se distanciam, como um imperativo dessa vida que vai criando vazios entre as pessoas.

a barriga dela está cheia de gases. ela pede socorro. tento lhe ensinar minha técnica para eliminar gases. peidar discretamente, sem muito alarde. fico assim quando estou só em meu quarto com a barriga inchada e dolorida. contorcionista de ocasião, posição meio iógue, deitado de costas e pernas pra cima passando sobre o corpo, alongando e relaxando, respirando fundo e soltando lentamente. funciona bem. sou um monte de merda nessa hora. a solidão atroz me corroendo nesse quarto de paredes azuis.

Cuiabá (MT) · 14/7/2006 18:10

algo bole

um corte na paisagem
(olhar pra dentro)
sem graça
sem raça

sem maçã
loucos desvarios longos

mundo sem cor
mudo
modo de não ser

sem chapéu

sem papel em branco
que comova

nem azia
afazia talvez
afásico
sem faísca

algo lerdo algo mole algo
bole

mesmo em silêncio
as vísceras transpiram
espreitam -alto lá!
algo se move
tratados hipocrisias seres doentes

roemos cordas
hordas de roedores

vivemos nos arredores do que poderíamos ter sido

de esquina em esquina um esquimó na latrina
contrariando a contra-mão

sermão sem montanhas

horizonte vasto e desértico
vago vago.

Cuiabá (MT) · 12/7/2006 16:10

desertor

agora
só consigo atingir
seu coração de puta

meio a sedas lilazes
malemolentas

não!

recuso seu gesto
beijo de batom exagerado

refuto suas ligas
de meias seda

(mergulho na tormenta
desse meu deserto
sem cor)

Cuiabá (MT) · 12/7/2006 12:50

o silêncio dessa hora

o verbo está entalado
travo luta em vão

detenho-me
avanço
no entanto, não páro!

a luta é silenciosa
a noite calliente
a boca do gato enfastiada
a palavra riscada no papel ao lado

Cuiabá (MT) · 7/7/2006 17:43

(n)avis rara

poesia
avis ra
ra
bisca
ra
teia

aquilo que
salteia

-observe.

da bateia
como dia
mante da
língua-viagem.

Cuiabá (MT) · 6/7/2006 19:05

coruja

-Vá dormir Thaís, que você não é coruja.
Anna disse sorrindo.
-Meu tio João tinha uma coruja empalhada sobre a mesa em sua biblioteca, que me parecia tão infinita quanto os círculos borgeanos. Por mais que eu escrafunchasse não conseguia ver todos os títulos. Bibliotecas sempre me fascinaram, pareciam lugares sagrados e com um cheiro peculiar que me fazia viajar por mundos tão diversos quanto os jogos que criava para excitar a imaginação e visitar lugares que o corpo não alcançava nunca. O tio João instigava minha curiosidade, fazia invejar a sua infinidade de conhecimentos que me fazia encolher e ficar cada vez mais pequenino diante da grandiosidade que o mundo dos livros revelava. A coruja era o máximo para meus olhos de menino esquisito.
- Agora, você tem uma coruja viva. (disse Anna)
Foi assim...
O dia amanheceu como todo dia. Tinha entrevista marcada com uma TV para falar sobre meu papel de pai de 5 filhas, mantendo uma atitude considerada louca, como integrante de uma banda musical, diretor de TV, poeta, violeiro, escritor, etc etc. Boêmio, maluco, etc etc. Mas coruja!?
A coruja da biblioteca tinha um ar distante como todo corpo morto. Lembro da cara da tia Dora morta, tão longe que nada podia alcançar aquelas lonjuras. Mas uma ave tão rapina e comedora de olhos como a coruja imobilizada pelo empalhamento me provocava uma sensação de coragem infinita, podia tocar um corpo que um dia foi quente e feroz na defesa de seus filhos. Via Marco Polo seguia os caminhos do desorientado. Nunca consegui sistematizar meus conhecimentos. Persigo os títulos e nunca consigo alcançar a totalidade de nenhum autor e vivo de fragmentos, como o olho giratório e esquisito da coruja viva que encontrei voando pelos limites das paredes da cozinha de minha casa à meia-noite desse dia normal. Levei um baita susto, mas encostei a porta e fiquei ali parado buscando uma forma de me comunicar com ela. Balbuciei frases, mansamente, carinhosamente, dementemente eu ali conversando com uma coruja viva. Diferente da outra, empalhada, essa metia medo e me fazia sentir ridículo. Além do mais, a maldita parecia entender tudo e me olhava com aquela cara de coruja de olhos girando estranhamente de lado de frente de costas ela olhava por todos os lados e ângulos e eu balbuciando ridiculamente que cabia ela aqui em casa também sempre cabia mais um sempre cabia mais uma boca , onde come seis come dez e etc.
Anna perguntou:
-Será que coruja come ração de cachorro?!
Virei-me lentamente esticando o pescoço e falei pra Thaís minha filha mais velha, balbuciando.
-Tem uma coruja na cozinha.
- Ah! Pai, não viaja...
-É sério, é de verdade, não é empalhada.
- Anna, venha ver.
Anna viu, Anna pirou, Thaís viu, Thaís pirou.
A noite passava e com ela os mistérios da vida que emitem sinais estranhos, provocando nossa compreensão, poetizando a existência e estranhamente nos colocando cara a cara com uma coruja.
Anna e Thaís foram dormir. Fiquei sentado em frente à TV como um boneco sem vida. Ao constatarem a veracidade do fato ficaram em estado de choque também, a coruja pousada sobre a pia da cozinha reinava soberana, ninguém se atrevia a passar pela porta, tampouco deixá-la aberta. Lembrava das lendas criadas em torno das corujas, furam os olhos, são sinais malditos e tal e coisa. Meia-noite e resolvo abrir a porta da cozinha. Ela se assusta, voa como ave louca pelo pequeno espaço, fecho a porta com cuidado e volto à sala.
Acordo de manhã, assustado, no sofá, a tv ligada e fora do ar.

Cuiabá (MT) · 3/7/2006 18:36

a dança dos fantasmas

a chuva cai
serena
em silêncio fresco (cortado
apenas
pelos pingos)

caem sobre a tampa velha
de isopor
esquecida (repousa)

no quintal

vento leve
intermitente
balança (sombras das folhas da árvore)

profunda paz
amortece meu espírito
(indômito)

as roupas dançam no varal
fantasmas com suas roupas prediletas
(dançam)

mexo remexo

velhos baús

sua fotografia parece que sorri para mim
sob suave frio
(o céu)

vermelho carmim

(nota do editor: poesia é coisa de frescos
poesia é coisa de fracos
poesia é coisa de frascos

o menor perfume)

Cuiabá (MT) · 30/6/2006 11:08

nada a declarar

nenhum verso
nenhuma canção

nada de vento
nessa tarde
nenhuma folha se mexe

nada a ver com você
nenhuma relação com isso
nenhuma lembrança

nenhum riso
nada de arriscar vôos
nenhum sopro

nem tédio
nem remédio

Cuiabá (MT) · 28/6/2006 20:07

tanto faz

é sábado? domingo?
lá fora é outro dia

diferentes são os tempos
nos lugares

o calendário é um
a vida não

cá dentro faz outono
tempo de morrer para renascer

das cinzas do cerrado
ou do cigarro

a vida queima
espouca

num choro de bebê
ou numa garrafa de champagne.

Cuiabá (MT) · 26/6/2006 16:59

noções banais do cotidiano para uma filosofia vagabunda

Ouço o ruído infernal do tempo roendo minhas carnes e músculos. Sigo a esmo, sabendo não existir medidas para o porvir. Esgoto as energias acumuladas no sono pretérito.
Os motores explodem sobre o silêncio, o latido histérico do cachorro se soma ao som das máquinas, o cachorro late da casa do vizinho, cercado de muros esverdeados pelo musgo, no inevitável movimento de partículas diversas arrastando tudo para a frente, para a morte. As formas da morte se revelam entre as várias faces da vida e tudo segue para inexorável fim.
Ouço seus passos caminhando sobre desvios, suas mãos tateando escuros impertinentes, seus olhos piscando agonias como grilos saltitantes. O lamento de eras ecoa em meus ouvidos atentos. Ouço seu tremor, seu coração rasgando o tempo, sua insistente resistência.
Nada posso fazer sob o peso que se acumula sobre os olhos tristes do retrato que repousa na parede. O amarelo vai se derramando na moldura do tempo. Os sonhos perdendo clareza, turvando a beleza, embaçando corpos e vontades. Nada mais que rastros sobre a fina estrada que se estreita, evocando lembranças, abraço eterno da noite que se prolonga.
A chuva cessa seu ritmo contínuo de horas ? num soluço contido, silenciando o coaxar de sapos e gias. Atiro-me na cama, na ressaca reinante sem temor. Nenhuma expectativa, não espero nada, testemunho esses pequenos eventos que me bastam, à revelia do mundo inteiro que gira do avesso. Ela pensa que estou dormindo, ouço seus passos atravessando o quarto com leveza, tal qual um fantasma que se atira no mistério da noite sem fim.

Cuiabá (MT) · 21/6/2006 19:36

o banquete

convidamos os fantasmas e eles vieram
todos
para nosso espanto.

florbela espanca e silvia plath
nos domínios de nossa cama.

eus e annas.

baús de poetas mortos
revirando asas
escolhendo o modelo mais adequado
para o seu vôo.

elas riem, choram, gozam
em minhas propriedades
supremos gozos
divinizo
bebo de sua alma
convivo com seus perfumes
e não peço perdão pela sua morte. segundo me disseram
os poetas já nascem mortos.

não sinto saudade
não a dor
não sinto
amor

só o gosto da flor murcha
que pousou no vaso
sem lágrimas
da sala cheia de fantasmas.

Cuiabá (MT) · 20/6/2006 15:12

lado alado

eu não
tenho
asas par
a voar

no poe
ma não
precisa
asas par
a voar

na poe
sia as
asas
são

Cuiabá (MT) · 14/6/2006 20:08

queda

tecer o quê? (na) manhã que invade tudo de luz, pelas frestas, pelo canto do olho que foge para a não-contemplação. reflexos explodem como faíscas rebatidas pelas superfícies cromadas lisas espelhares.

tecer o quê? (se) a morte promete o conforto do supremo esquecimento, fazendo libertar das urdiduras da vida os destinos mais vis.

fazer o quê? (se) a ponta da linha salta da ponta da língua e serpenteia pelos cantos desconectados da mente dormente.

fazer o quê? (se) a macia mão (às vezes áspera) do acaso nos lançou a esse estado sólido caindo
caindo
na vertigem do tempo.
?
?
?
?
?


Cuiabá (MT) · 12/6/2006 18:02

por quem os sinos não dobram mais

antonio sodré é o nome do autor desse poema que se segue. um sacerdote dessa arte tão difícil, missionário das mais de mil letras. ele afirma que já morreu mil vezes: el poeta de la transmutación.



na manhã que se segue
os sinos não dobram mais
por Elizabeth!

perdeu os ouvidos
e não ouve mais
o coaxar das rãs
o mugido do boi
o piar do grilo...

(nem o sino ela ouve mais...)

por isso é que eles não dobram
nem por ela, nem por mim,
nem pelo quinto serafim!

não há mais sinos,
não há mais meninos.
cantar de rodas não se ouve mais...
tropel de cavalos não se ouve mais.
é no ar que se travam batalhas.


antonio sodré (extraído do livro "Empório Literário, versos diversos")
poeta matogrossense.

Cuiabá (MT) · 8/6/2006 17:30

diário de um (l)ôco.

uma tristeza pinta as paredes do meu quarto com cores difusas.
desenhando ondas loucas.
sideradas. cataclísmicas.
sensações de um remoto improvável me acometem.
muito além do entendimento - com cheiro de merda e agonia.

excremento
fertilizando pólens
a morte fertiliza
dá o mel
o vinho
a ira

tudo resto de nós
sobras
tristes restos de mim.

vejo rastros
rasgos rugas
peso de eras


inverno verão primavera
outono sem fim

as folhas caem

Cuiabá (MT) · 5/6/2006 18:18

cadernos da meia noite

página a página vou escrevendo histórias da vida.
páginas em branco também são encontradas nesse diário.

espelhos invertidos
de mim e de você

não sou o que escrevo
nem o que falo

algo talvez ali
entrelinhas fuçando vazios

enchendo de pausas
esse gosto por banalidades.

Cuiabá (MT) · 30/5/2006 19:20

bom dia, lucidez!

rompe a manhã.
um fio de luz
atravessa janelas

entre
abertas

renasce o dia
depósito dos restos da noite

rastros invisíveis
de fantasmas anônimos

filhos do acaso
com laços nos pescoços
lançados à própria sorte

à deriva
ruas de solidão
dando voltas

mas a manhã
revigora gestos
refaz caminhos: bom dia, lucidez. o louco rodopia nos calcanhares de um bailarino grotesco. sabiá laranja pousa sobre o mel da fruta. sabiá canta e se lambuza de mel.
a luz doura quintais. alvoroço.

-bom dia. diz o freguês na padaria da esquina.
o balcão repleto de sonhos repousa diante do olhar ávido do garoto sorridente.
-mãe, quero um sonho.

Cuiabá (MT) · 27/5/2006 16:46

Luxúria

quero luxo
esbórnia
luxúria

pra gastar
sola
de sapato alto

viver nas alturas
ébrio
andante

entre um solstício
e outro

aliás
hoje não quero
nada

quero o silêncio
esquecido num canto
de sala

o triste
emudecido
armário

escuro

Cuiabá (MT) · 26/5/2006 17:29

Enigmã

per
sigo a
luz

como a um imã
enigmã

a luz me a
trai como
imã

enigma

Cuiabá (MT) · 23/5/2006 17:56

Xeque-mate: MT Salão

Cuiabá, 17 de maio de 2006, Pantanal Shopping (sic! cadê os museus dessa cidade?), avenida do CPA, nove e cinquenta da madrugada (sic! de novo), secretário de Estado, secretário adjunto, conselheiros de cultura, assessores, um monte de artistas que ganhou prêmio, jornalistas, donos de galerias e moldurarias, ?gente normal? (?) não vi, enfim, nosso 23° Salão Jovem Arte Matogrossense acontece, abre as portas, dos fundos, reviravolta nos confins do Brasil: tiram o primeiro prêmio de Paulo Pires. Alerta: bastidores da indústria cultural, aconselha-se, em caso de estômagos fracos, parar de ler por aqui, algo muito estranho no ar, como sempre. Vamos aos fatos: Paulo Pires, desavisadamente(artista lê regulamento?) coloca uma obra, entre as demais, que já fora premiada num Salão anterior, ponto, toda curadoria do Salão passa ?batido?, ninguém percebe que a tal obra já fora premiada, os jurados, que são: sr Humberto Espíndola, sra Lisbeth Rebollo Gonçalves, sr Chico Cunha, dizem-se soberanos, julgam as obras dos escolhidos pela curadoria do salão, que são: sr Gervane de Paula, sr Serafim Bertolotto, sra Aline Figueiredo, a decisão é unânime : o conjunto da obra do escultor Paulo Pires é o melhor conjunto e vence o Salão, vence mas não leva. A curadoria descobre o próprio erro, sim, pois as obras de vários artistas foram ?aconselhadas? pela mesma curadoria que andou por todo MT oferecendo seus ?conselhos? aos artistas, pois o que interessa ao júri do Salão é o conjunto da obra e não uma obra em si, premia-se uma para ir pro acervo do Salão, mas, é o conjunto que prevalece, então numa reviravolta estonteante recuam Paulo Pires para quarto lugar (sic!) e vão, o segundo para primeiro, o terceiro para segundo, o quarto para terceiro (ufa!), e o primeiro colocado para quarto, entendeu aí galera? Se tava fora das ?normas? por que premiaram Paulo Pires? se permitiram que ele retirasse a obra ?desavisada? porque então não deixaram as coisas como estavam? Se dão o quarto prêmio a Paulo Pires, que é o melhor conjunto, não assumem o erro? Quem errou? Devemos entender, devemos questionar, devemos debater essas questões, devemos abrir as portas das casas públicas e entender os processos de tomadas de decisões que nos envolvem a todos que trabalhamos com arte. Maquinações políticas? Grupos se enfrentando? Casas caindo? Explosão de arbitrariedades? Mexem-se os pauzinhos, reuniões, gritos, urros, o lamento dos tempos imemoriais. Resumo da ópera bufa: o brilho das obras ofuscado por uma péssima iluminação (o shoping Pantanal não tem, ainda, condição nenhuma de comportar uma exposição de artes plásticas) e o poder nefasto, cada vez mais claro, de barganha dos envolvidos na (des)animação cultural de Mato Grosso. Conversei com algumas pessoas envolvidas no ?processo?e ninguém me indicou um caminho seguro, corda bamba, disseram que para não penalizar o vencedor decidiram ?dar? o quarto prêmio a ele, Paulo Pires, que de fato, ganhou o nosso Salão com o melhor conjunto de obras. Os artistas envolvidos? Incrível como ninguém se posiciona. Cala-se, aceita-se, entra-se no jogo do poder e todos com seus tapinhas nas costas vão para casa se deliciar com os caraminguás ?dados? pelo combalido Salão Jovem Arte Matogrossense. Termino citando de novo o grande poeta Antônio Carlos Lima: ?Já é tarde, já até arde em nós a esperança de que dias melhores virão?.

(André Balbino, artista plástico, músico, cidadão indignado.)

Cuiabá (MT) · 18/5/2006 16:21

Nem Baudelaire, nem Novalis

a adesão ao princípio de que nada se completa. adesão ao movimento e só.
nova lis. nova flor do pantanoso terreno do conhecimento. sínteses do inexorável. nem baudelaire.
nem novalis

a nova lis usa laços roxos.
é de gosto áspero
a cor do gosto di paixão i vísceras expostas
mais que dentes dionelianos
mais que piracicaba
mais que cuiabá. qualquer lugar é menos.
daqui o lugar quioblíquos navegamos
o roxo em preto e branco
rendas que caem sobre seus olhos.

o gosto do chão, da paixão
coração de cordas esgarçadas
no (des)ritmo das horas
quebrado entre padrões
(des)repetição
disrritmia
dois erres separam a questão
ortográficos
dois erros
rr
rrosna
rronca
rrompe.

Cuiabá (MT) · 12/5/2006 20:21

sábado, 28 de junho de 2008

girando em círculos

a cidade acontece aos poucos.
se acaba
nas vitrines do horror. asas de anjo de plástico enfeitam templos
de pedra.
longos e tristes trópicos -

desocupados se arrastam nas vias
marginais
buscam lugar para jogar seus corpos
aquecer
se decompondo - atrozes carniças
sombras soturnas
despossuídos peregrinos

as vias se multiplicam em faróis coloridos
ilusão para a rotina
rios de chamas

a cidade é viva e misteriosa
muito além dos seus muros -
vigilantes corpos
diante do vertiginoso movimento da vida
gira
gira
gira.

Cuiabá (MT) · 10/5/2006 19:47

tarde insp

tarde insp
incomplet
insip tard
tard emai
s desmaia
da tard o
mas nãof
aiaaiaiaia
inspirado
de maio
pálido mê
sacoasco
casco di
marimbon
do casa d
fogo fire
para os d
esavisados
depois nã
diga que n
avisei

Cuiabá (MT) · 3/5/2006 16:19

Bocas Acesas - collage (erroteiros)

luzes que falam
bocas acesas
no retrovisor - (anna marimon)

pingo tinto divinho
no marolhar vermelho
espelho dibaco dionísios - (eduardo ferreira)

carros passam lá fora
e o vento dessa manhã fria
sacode de leve as folhas da mangueira - (antonio sodré)

Cuiabá (MT) · 1/5/2006 17:50

martírios

mar de martí
rios minha nau
singra escuras
águas traves
sia vertigi
nosa volá
til mare
sia não há
mar aqui
memória de
mar apena
s olho d'água
voa voa
grande
ave

Cuiabá (MT) · 26/4/2006 13:01

giramundo

quantos sóis
quantas luas

em seus seios?

quantos golpes
desviam olhos

quantos girassóis?

a borboleta voa

quantas asas?
tanto céu

rios bocas mares remo mofo sabores

quantos?

Cuiabá (MT) · 24/4/2006 09:24